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O Grifo
Grimm Märchen

O Grifo - Contos de fadas dos Irmãos Grimm

Tempo de leitura para crianças: 21 min

Era uma vez um rei muito poderoso; em que parte do mundo ele reinava e como se chamava, já não sei mais. Esse rei não tinha filhos homens, só tinha uma filha que vivia doente e médico nenhum conseguia curá-la. Um dia, alguém predisse que a princesa só se curaria se comesse uma maçã. Então o rei fez anunciar por todo o reino que, aquele que trouxesse à princesa a maçã, que a devia curar, casaria com ela e mais tarde seria rei desse país. A notícia chegou até uma aldeiazinha onde vivia um pobre camponês que tinha três filhos. Chamando o filho mais velho, disse-lhe:

– Pega uma cesta e vai ao pomar colher, na macieira maior, aquelas maçãs vermelhinhas e perfumadas e leva-as ao castelo. Talvez a princesa coma a que lhe deve restituir a saúde e assim casarás com ela. O rapaz fez o que dizia o pai; em seguida, meteu-se pela estrada a fora rumo à cidade. Tendo andado bom trecho, encontrou um anãozinho que lhe perguntou o que levava no cesto. O rapaz, que se chamava Elias, respondeu:

– Levo patas de rãs. – Muito bem, – respondeu o anão; – assim é e assim ficará sendo. – E foi-se embora. Elias continuou o caminho e, por fim, chegou ao castelo, fazendo anunciar que trazia maçãs que curariam a princesa se as comesse. O rei ficou contentíssimo e fez entrar o rapaz. Mas, oh! quando Elias abriu o cesto, ao invés de maçãs só se viu um montão de patas de rãs, que ainda esperneavam. O rei ficou furioso e mandou que os criados o enxotassem quanto antes do castelo. Chegando em casa, Elias contou ao pai o que se passara. Então o velho disse ao segundo filho, que se chamava Simão:

– Colhe tu um cesto de maçãs e vê se tens mais sorte que teu irmão. Simão obedeceu, e, quando ia pela estrada, encontrou- se, também, com o anãozinho, que lhe perguntou o que levava no cesto. Em tom de mofa, Simão respondeu:

– Levo cerdas de porco. O anão disse-lhe:

– Muito bem; assim é e assim ficará sendo. Quando Simão chegou ao castelo e se apresentou, a sentinela não queria deixá-lo entrar, dizendo que já haviam sido enganados por um outro. Mas Simão insistiu, afirmando que trazia as melhores maçãs, que certamente curariam a princesa. Por fim, levaram-no à presença do rei. Mas, quando abriu o cesto, viu-se dentro dele um punhado de cerdas de porco. O rei enfureceu- se de tal forma que mandou expulsar o rapaz a chicotadas. Chegando em casa, Simão contou a triste aventura ao pai. Então veio o mais moço dos filhos, que se chamava Joãozinho, e que todos tratavam com pouco caso por o acharem um tanto pateta, e pediu ao pai para levar ao castelo o cesto de maçãs. – Sim! – disse o pai com certo desprezo; – és realmente muito indicado! Se teus irmãos, que são mais espertos não o conseguiram, como é que um parvo como tu o conseguirá? Mas Joãozinho não parava de insistir. – Deixa-me ir, pai. Deixa-me ir! – Santo Deus, cala-te, pateta! – respondeu o pai amolado; – de vias procurar tornar-te um pouco mais esperto! – e com isso deu-lhe as costas. Joãozinho não se conformava e, puxando-o pelo paletó, tornou a pedir:

– Eu quero ir! Deixa-me ir, pai. – Pois bem, vai em santa paz; havemos de nos ver à tua volta! – respondeu com impaciência o pai. O rapaz dava pulos de alegria e não cabia em si de satisfação. – Bem, não te ponhas doido, agora! Cada dia ficas mais estúpido! – explodiu o pai, muito irritado. Mas Joãozinho não se importou com isso e, também, não perdeu a alegria. Entretanto, como já estivesse anoitecendo, resolveu esperar até à manhã seguinte, pois, de qualquer maneira, não chegaria nesse dia ao castelo, e foi-se deitar. Mas, na cama, não podia adormecer; virava-se de um lado e de outro. Quando, por fim, conseguiu pegar no sono, sonhou com lindas donzelas, com castelos magníficos, com pilhas de ouro e prata e outras coisas belas. Logo, ao romper do dia, foi colher as maçãs e pôs-se a caminho. Encontrou-se, também, com o anão velhinho, que lhe perguntou o que levava no cesto. Joãozinho respondeu que levava maçãs para curar a princesa.

– Muito bem, – respondeu o anão; – assim é, e assim ficará sendo. Ao chegar ao castelo, porém, as sentinelas não queriam de modo algum deixá-lo passar, porque já tinham vindo outros alegando que traziam maçãs, e um trazia patas de rãs, enquanto o outro apresentou cerdas de porco. Mas Joãozinho não se deu por vencido. Jurou, afirmou que não trazia nada dessas coisas e sim lindas maçãs, as mais belas que existiam em todo o reino. Falou com tanto desembaraço e franqueza, que a sentinela se convenceu de que não estava mentindo e o deixou entrar. E não se arrependeu, pois, quando Joãozinho retirou a tampa do cesto, na presença do rei, viram surgir belíssimas maçãs douradas e que espalhavam perfume delicioso. O rei alegrou-se muito vendo-as e mandou logo levá-las à filha. Depois ficou esperando ansioso pelo efeito produzido. Não demorou muito, chegou a resposta. E sabes quem a trouxe? Foi a própria princesa. Assim que provara uma dessas maravilhosas maçãs, sentiu-se restabelecer de imediato e, muito contente, saltou da cama, sã e vigorosa. Impossível descrever a felicidade do rei. Agora, porém, que viu a filha curada, não mais queria dá-la ao pobre campônio. Não sabendo como livrar- se dele, disse-lhe que, antes de receber a princesa por esposa, teria de fazer um barco que andasse tão bem por terra como por mar. O pobre Joãozinho aceitou a condição, com certa tristeza. Voltou para casa e contou ao pai tudo o que se passara. O pai resolveu, então, mandar Elias à floresta para escolher a madeira e fazer o barco. Elias estava lá trabalhando com afinco e assobiando uma canção, quando, ao meio-dia, no momento em que o sol estava a pique, aproximou-se dele o anãozinho e perguntou o que estava fazendo. Elias, mal educado como sempre, respondeu:

– Cavacos. – Bem, – disse o anão; – assim seja e assim fique sendo. No fim do dia, certo de haver construído o barco, quis subir nele, então viu com espanto que só tinha cavacos aí. No dia seguinte, Simão foi à floresta com a mesma incumbência, mas aconteceu-lhe tudo exatamente como ao irmão. No terceiro, chegou a vez do Joãozinho. Chegando à floresta, pôs-se a trabalhar com tamanho afinco que as marteladas se ouviam longe; cantando e assobiando alegremente, ia construindo o barco. Ao meio-dia, quando o sol estava bem a prumo no céu, apareceu o anão perguntando o que estava fazendo. – Tenho de fazer um barco que tanto ande por terra como por mar, – respondeu ele. – Se o conseguir, eu me casarei com a filha do rei. – Bem, – disse o anão; – assim é e assim ficará sendo. No fim do dia, Joãozinho terminara o barco com os pertences correspondentes; meteu-se dentro dele e pôs- se a remar para a cidade. E o barco deslizava tão velozmente como se impelido pelo vento na água. O rei viu-o de longe chegar com o barco, mas continuou a relutar em dar-lhe a filha e, como pretexto, disse-lhe que devia submeter-se a outra prova. – Deves pastorear durante um dia as cem lebres brancas que ela possui. Se faltar uma só esta noite à chamada, – disse o rei, – perdes o direito à mão de minha filha. E lá se foi o pobre Joãozinho, no dia seguinte, levar as cem lebres ao pasto, vigiando bem para que não lhe escapasse nem uma. Pouco depois veio uma das cozinheiras do castelo e pediu para levar uma das lebres, pois, tendo recebido visitas, queriam que a preparassem para o jantar. Joãozinho compreendeu muito bem que isso não passava de um ardil e recusou entregar a lebre; o rei podia, se quisesse, oferecer a lebre no dia seguinte às suas visitas. Mas a criada continuava a insistir e, por fim, acabaram brigando; na sua exaltação, Joãozinho disse que só entregaria a lebre se a princesa em pessoa viesse buscá-la. A criada foi e contou à princesa. Nesse interim, apareceu o anão e perguntou a Joãozinho o que estava fazendo aí. – Ah, – respondeu ele, – tenho de guardar as cem lebres da princesa e não deixar escapar nem uma; só assim poderei casar com a filha do rei e herdar o trono. – Pois bem, – disse o anão, – eis aqui um apito; se alguma delas fugir, só tens de apitar e ela voltará imediatamente. Pouco depois, chegou a princesa e Joãozinho pós-lhe uma lebre no avental de renda. Mas não havia andado cem passos ainda, e Joãozinho tocou o apito e a lebre pulou do avental e, com alguns saltos, foi juntar-se às companheiras. Ao anoitecer, Joãozinho tornou a apitar, reuniu todas elas e conduziu-as ao castelo. O rei ficou muito admirado ao ver que o rapaz conseguira guardar as cem lebres sem deixar escapar nem uma; ainda assim, porém, não queria dar-lhe a filha. Então, propôs-lhe como última condição, uma coisa que julgava humanamente impossível de se obter. Queria que lhe trouxesse uma pena do rabo do grifo. Joãozinho logo se pôs a caminho, seguindo sempre para a frente com desassombro. Pela tardinha, chegou a um castelo e pediu hospitalidade para aquela noite, pois nesse tempo ainda não existiam hospedarias nem albergues. O proprietário do castelo recebeu-o com muito agrado e perguntou para onde ia. – Vou em busca do grifo, – respondeu o rapaz.

– Ah, vais procurar o grifo! Dizem que esse animal sabe tudo quanto se passa no mundo; queres fazer o favor de perguntar-lhe onde se poderá encontrar a única chave que abre a caixa-forte onde guardamos todo o nosso dinheiro? Há tempo que a perdemos! – Perguntarei com todo o gosto, – disse Joãozinho. Retomou o caminho logo pela manhã e, ao anoitecer, chegou a outro castelo e aí também pediu hospitalidade. Quando os castelões souberam que ele ia à procura do grifo, pediram-lhe que perguntasse o que poderia curar-lhes a única filha, que estava doente, e nenhum remédio dava resultado. João prometeu que o faria de muito boa vontade e de novo se pôs a caminho. Dentro em pouco, chegou à margem de um rio largo e profundo, sobre o qual não se via ponte alguma. Nisto viu chegar um enorme e musculoso remador com um barco, que tinha o encargo de transportar as pessoas para a outra margem. O homem perguntou-lhe onde ia.

– Vou em busca do Grifo, – disse Joãozinho. Então o homem pediu-lhe para perguntar ao grifo porque era que tinha sempre e sempre de transportar gente de uma a outra margem, sem nunca descansar. Joãozinho prometeu fazê-lo. O homem transportou-o para o outro lado e ele continuou o caminho. Depois de andar um bom trecho, chegou, finalmente, à casa do Grifo, que estava ausente no momento, encontrando-se lá apenas sua mulher. Esta perguntou ao rapaz o que desejava. Então Joãozinho contou-lhe tudo; dizendo também que tinha de levar uma pena do rabo do grifo; em seguida contou-lhe as perguntas que o encarregaram de fazer, isto é: onde estava a chave da caixa-forte do castelo, perdida há muito anos; num outro castelo estava doente a filha dos castelões e queriam saber o que a poderia curar e, finalmente, no rio próximo dali, havia um barqueiro que precisava transportar todas as pessoas sem nunca descansar, e queria saber o que devia fazer para livrar-se daquilo. A mulher, então, disse-lhe:

-Meu bom amigo, nenhum cristão pode falar com o Grifo; ele os detesta e devora todos quanto encontra. Como és um bom rapaz, vou ajudar-te. Mete-te debaixo da cama e à noite, quando o Grifo estiver dormindo, estica o braço e arranca-lhe uma pena do rabo; quanto às perguntas, eu as farei e tu ouvirás as respostas. Joãozinho seguiu os conselhos e escondeu-se debaixo da cama. Pela tardinha, ouviu-se um grande ruído e bater de asas; era o Grifo que voltava e, assim que entrou no quarto, disse:

– Mulher, estou sentindo cheiro de carne humana. – Tens razão, – disse a mulher, – hoje esteve um rapaz aqui, mas já se foi embora. O Grifo contentou-se com essa resposta. Mais ou menos à meia-noite, quando ele roncava sonoramente Joãozinho, com muito cuidado, arrancou-lhe uma pena do rabo. O Grifo deu um pulo na cama e gritou:

– Mulher, continuo sentindo cheiro de carne humana e parece-me que alguém me puxou o rabo. – Ora, ora, – disse a mulher, – com certeza sonhaste; eu te contei que esteve aqui um rapaz mas que logo se foi. Ele contou-me uma porção de coisas! Disse-me que, num castelo distante, perderam a chave da caixa- forte e não conseguem mais encontrá-la! – Que tontos! – resmungou o Grifo, – A chave está no depósito de lenha, atrás da porta, em baixo de uma pilha. – Depois contou-me que noutro castelo há uma moça muito doente e ninguém conhece algum remédio capaz de curá-la. – Que tolos! – respondeu ele. – Debaixo da escada que vai à adega, há um rato que fez o ninho com os cabelos dela; se conseguir reaver os cabelos, ela ficará curada. – E, sabes, disse-me ainda que aqui por perto há um rio no qual se encontra um barqueiro que transporta a gente para a outra margem; ele gostaria de saber o que deve fazer para se livrar desse trabalho. – Que estúpido! – disse o Grifo; – se uma vez largasse alguém no meio do rio, nunca mais teria de transportar ninguém. Pela manhã, o Grifo levantou-se e saiu para os seus afazeres. Então Joãozinho deixou o esconderijo, seguram do a pena arrancada do Grifo; além disso ouvira e guardara na memória o diálogo havido entre a mulher e o Grifo; esta repetiu-lhe tudo outra vez para que ele não se esquecesse e, depois de agradecer e se despedir gentilmente da mulher, Joãozinho seguiu de volta para o reino. Tendo chegado à margem do rio, fez-se transportar para o outro lado; depois disse ao homem que, quando viesse alguém, o largasse no meio do rio, assim nunca mais teria de transportar ninguém. O homem agradeceu- lhe muito e perguntou-lhe se queria ser transportado ainda uma vez de um lado para outro, mas Joãozinho não aceitou, dizendo que preferia poupar-lhe aquele trabalho, depois seguiu para diante. Ao chegar ao castelo onde estava a jovem doente, carregou-a às costas, porque ela não podia andar, e levou-a à adega; descobriu o ninho do rato debaixo da escada e entregou-lho. Pegando os cabelos, ela ficou imediatamente curada e saiu correndo na frente dele pela escada acima, alegre e feliz como nunca. Os pais, radiantes de felicidade, presentearam Joãozinho com uma grande quantidade de ouro, prata e pedras preciosas, dizendo que levasse tudo quanto quisesse. Ao chegar no castelo seguinte, o rapaz foi diretamente ao depósito de lenha e, atrás da porta, sob uma grande pilha de lenha, encontrou a chave da caixa-forte, que entregou ao dono. Este se alegrou imensamente e deu-lhe tanto ouro quanto lhe era possível carregar, além de muitas outras coisas: vacas, ovelhas, cabras, enfim, tudo o que ele quis. Assim, quando Joãozinho chegou ao castelo do rei, pai de sua noiva, com toda aquela riqueza e ainda por cima a pena do Grifo, o rei perguntou-lhe onde tinha conseguido tudo aquilo. Joãozinho disse-lhe que o Grifo dava tudo o que se queria. Então o rei pensou que seria muito bom possuir tanta coisa e resolveu ir ter com o Grifo. Pôs-se logo a caminho e, quando chegou ao rio, aconteceu que era justamente a primeira pessoa que aparecia depois de Joãozinho; o barqueiro transportou-o no barco mas, quando iam ao meio do rio, pegou o rei e largou-o dentro da água e foi-se embora, deixando que ele morresse afogado. Alguns dias depois, Joãozinho casou com a princesa e tornou-se o rei muito estimado daquele país.

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NúmeroKHM 165
Aarne-Thompson-Uther ÍndiceATU Typs 610
TraduçõesDE, EN, DA, ES, FR, PT, IT, JA, NL, PL, RU, TR, VI, ZH
Índice de legibilidade de acordo com Björnsson35
Flesch-Reading-Ease Índice32.7
Flesch–Kincaid Grade-Level12
Gunning Fog Índice15.2
Coleman–Liau Índice9.8
SMOG Índice12
Índice de legibilidade automatizado7.2
Número de Caracteres15.115
Número de Letras11.792
Número de Sentenças167
Número de Palavras2.710
Média de Palavras por frase16,23
Palavras com mais de 6 letras508
percentagem de palavras longas18.7%
Número de Sílabas5.049
Média de Sílabas por palavra1,86
Palavras com três sílabas622
Percentagem de palavras com três sílabas23%
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